Foto 1: Caminhada até os fornos da Usina Cambahyba.
Alvaro Britto*
Local onde foram incinerados os corpos de 12
presos políticos pela Ditadura Militar (1964/1985), a extinta Usina Cambahyba,
em Campos dos Goytacazes, sediou no dia 6 de dezembro o ato de abertura de uma série de manifestações de protesto para marcar os 60
anos do golpe militar de abril de 1964. Na ocasião também foi reivindicada a
criação do Memorial Cambahyba Ditadura Nunca Mais, por Memória,
Verdade, Justiça, Reparação e Reforma Agrária.
Foto 2: Cartaz com fotos de 12 presos políticos
que tiveram seus corpos incinerados nos fornos da Usina.
Nas terras da antiga Usina foi criado pelo
presidente Lula em agosto de 2023 o assentamento Cícero Guedes, cujo nome homenageia
o militante que se libertou do trabalho análogo à escravidão em lavouras de
cana-de-açúcar na infância, em Alagoas, e migrou para Campos. Aprendeu a ler
aos 40 anos, integrou o MST, na virada do século foi oficializado no
assentamento Zumbi dos Palmares, na área da extinta Usina São João, também no
município. Cícero foi assassinado a tiros em 2013.
A mobilização contou com centenas de pessoas,
entre famílias assentadas da Reforma Agrária das regiões Norte e Noroeste
Fluminense, representantes de movimentos sociais, entidades e coletivos de direitos
humanos, universidades e instituições governamentais, como o Incra e os
Ministérios do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e dos
Direitos Humanos e Cidadania (MSHC), além de familiares de presos políticos
torturados e mortos das prisões da Ditadura Militar.
Foto 3: Familiares de Fernando Santa Cruz
Estavam
presentes familiares das 12 pessoas que foram incineradas naquele local – Ana
Rosa Kucinski Silva (ALN), Armando Teixeira Frutuoso (PCdoB), David Capistrano
(PCB), Eduardo Collier Filho (APML), Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira
(APML), João Batista Rita Pereira (VPR), João Massena Melo (PCB), Joaquim Pires
Cerveira (FLN), José Roman (PCB), Luiz Inácio Maranhão Filho (PCB), Thomáz
Antônio da Silva Meirelles Neto (ALN) e Wilson Silva (ALN).
Foto 4: Familiares de David Capistrano
Brasil sem ódio
O chefe da Assessoria
Especial de Defesa da Democracia, Memória e Verdade do MDHC, Nilmário Miranda, destacou
que o momento rememora um fato extremamente vergonhoso para o Brasil, por isso
a importância de lembrar para que as coisas nunca mais se repitam. “Esse dia
também simboliza a renovação da esperança de construir um Brasil livre do ódio,
do preconceito e da discriminação por orientação religiosa”, afirmou.
Já o coordenador-geral de Memória e Verdade e Apoio à Comissão Especial
de Mortos e Desaparecidos Políticos, o também poeta Hamilton Pereira, que
passou a usar o pseudônimo Pedro Tierra para conseguir enviar seus poemas para
fora do presídio na ditadura, visivelmente emocionado, doou três livros de sua
autoria ao MST, um deles através do jovem Matheus Guedes, filho de Cícero
Guedes, da coordenação do assentamento Zumbi dos Palmares.
Foto 5: Pedro Tierra entrega livro para o jovem
assentado Matheus Guedes.
Reforma Agrária
A deputada estadual Marina do MST (PT/RJ) participou das
atividades e numa fala emocionada relembrou a história do local, do MST e
sua própria trajetória nas terras da Usina Cambahyba. A parlamentar
ressaltou a importância das lutas políticas e institucionais caminharem juntas
em defesa da justiça social.
"O nosso mandato, junto com outros
companheiros da Alerj (Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) vamos
continuar a luta para transformar esse local que foi um local da morte em um
local da vida, vamos continuar a luta para transformar esse local que foi de
exploração dos trabalhadores em cooperação, em transformar esse local que foi
de degradação ambiental em agroflorestas produtivas, nos comprometemos em
transformar esse local que foi da fome e exploração num local de produção
de comida saudável, da agroecologia, em fazer esse local em defesa da vida das
pessoas", disse Marina durante o ato.
Foto 6: Marina do MST discursando
“A criação do assentamento Cícero Guedes é uma grande
conquista dos trabalhadores sem-terra e emblemática da luta pela democracia e
pelos direitos humanos no Brasil. O resgate da memória dos presos políticos da
ditadura militar é o nosso compromisso de que eles não morreram em vão. Que
prosseguiremos na luta por justiça social, por reforma agrária e pelos direitos
do povo preto”, discursou a superintendente regional do Incra/RJ, Maria Lúcia
de Pontes.
Em
sua fala, o superintendente estadual do MDA/RJ, Victor Tinoco, lembrou o papel
essencial da Comissão Nacional da Verdade para a investigação e revelação dos
crimes da ditadura militar, entre eles a incineração dos corpos de presos
políticos nos fornos da Usina Cambahyba. “Esse é um legado fundamental da
mobilização da sociedade civil mas também do governo da ex-presidente Dilma
Rousseff”, ressaltou.
Trabalho
escravo
Foto 7: Ana Paula, da coordenação do assentamento
Cícero Guedes
“O ato foi histórico e importante para dar visibilidade e fortalecer
a luta por justiça das famílias dos militantes que tiveram seus corpos
incinerados nos fornos da Cambahyba. E também a reforma agrária, já que várias
famílias do acampamento Cícero Guedes são de trabalhadores rurais que sofreram
condições de escravidão na Usina, que agora poderão plantar e colher em uma
terra onde foram explorados e que agora será deles”, declarou Ana Paula
Saraiva, militante do MST e coordenadora do acampamento Cícero Guedes.
Foto 8: O jovem José Carlos, do MST, coordenando o
ato com Nilmário Miranda, Nadine Borges e Marina do MST.
José Carlos dos Santos, 21 anos, estudante do 7º período de
Jornalismo, é morador do assentamento Dandara dos Palmares, localizado em
Campos dos Goytacazes, desde os três anos de idade. Membro da Direção Estadual
do MST, Zé, como é conhecido, foi um dos coordenadores do ato no assentamento
Cícero Guedes. “Fiquei muito emocionado, ainda mais quando me pediram para ler
a carta de um dos familiares. A mensagem que a carta trouxe me marcou bastante,
foi realmente impactante estar ali naquele momento”, revelou o jovem assentado.
Foto 9: No ato: Marina do MST, Adriana do STR de
Itaperuna, Maria Lúcia do Incra e Alvaro do Pavio Curto.
Próximas
atividades
Outros
eventos serão realizados até o dia 1º de abril de 2024, quando partirá do Rio
de Janeiro uma grande Marcha Pela Democracia rumo à cidade mineira de Juiz de
Fora. Dela, há 60 anos, partiram as tropas da então 4ª Região Militar, com
destino ao Rio para derrubar o governo do presidente João Goulart, sob o
comando do general Olympio Mourão Filho, em conluio com o então governador de
Minas Gerais, Magalhães Pinto, e empresários de direita da época.
No próximo dia 13
de março, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) realizará, às 16 horas, no
seu auditório, no Centro do Rio, um
Ato Comemorativo dos 60 anos do histórico Comício da Central do Brasil. O Pavio
Curto também estará lá!!
Foto 10: Jantar após o ato: Pavio Curto com Marina
do MST e assessores, Incra e militantes do MST.
* Jornalista do Pavio Curto
Fotos: Alvaro Britto