quarta-feira, 6 de outubro de 2021

24 motivos para afastar Bolsonaro já!!

Denúncias vão da pandemia aos ataques à democracia, mas protesto contra a inflação começa a ganhar as ruas. 

Por Alvaro Britto 

    Desde 29 de maio, a oposição vem realizando manifestações frequentes nas ruas de todo o Brasil e no exterior contra o governo, reivindicando o impeachment de Bolsonaro. Nos atos iniciais, a principais bandeiras eram relacionadas à pandemia de Covid 19, tanto na exigência da vacinação como na defesa do auxílio emergencial e do combate à fome e ao desemprego. Com as revelações da CPI do Senado, somou-se a denúncia de corrupção.


    
Já no último dia 2 de outubro, além das reivindicações e denúncias anteriores, assumiu papel de destaque o protesto contra a alta dos preços dos alimentos, da gasolina, do gás de cozinha e da energia elétrica.  Em várias manifestações por todo o país, chamaram a atenção enormes réplicas infláveis de botijões de gás e sacos de arroz acompanhadas de faixas com a inscrição: “Está caro? Culpa do Bolsonaro!” 

Como pedir impeachment do presidente

    Ao todo, mais de 1550 pessoas e de 550 organizações assinaram pedidos de impeachment do presidente Jair Bolsonaro. Foram enviados 138 documentos ao presidente da Câmara dos Deputados, sendo 86 pedidos originais, sete aditamentos - — que servem para adicionar algo no pedido original - e 46 pedidos duplicados - que existem quando, por escolha ou questões burocráticas, pedidos de mesmo teor são protocolados mais de uma vez. Até agora, apenas seis pedidos foram arquivados ou desconsiderados. Os outros 132 aguardam análise.

    Qualquer cidadão pode entrar com um pedido de impeachment do presidente, desde que justifique o motivo com base na lei 1.079/50, conhecida como Lei do Impeachment. Não existe um rito ou obrigação para que a Câmara dos Deputados coloque o pedido em votação. Por isso, o mais antigo está em análise da presidência da Câmara há mais de 800 dias.  

    O tema mais recorrente entre os pedidos é a pandemia de coronavírus, citada em pelo menos 75 denúncias — prova que a condução da crise sanitária pelo governo federal, que comprou e divulgou remédios sem eficácia científica comprovadas e adiou a aquisição de vacinas, além de desestimular o isolamento social, gera grande incômodo em atores políticos e na cidadania.

    O segundo motivo que mais aparece se refere a declaração e participação do presidente em manifestações antidemocráticas. Por fim, “quebra de decoro” é o terceiro tema mais constante, o que indica que boa parte dos proponentes consideram as posturas do presidente incompatíveis com o cargo que ocupa.

    Os autores são de todos os matizes políticos e incluem ex-aliados de Bolsonaro, como os deputados federais Joice Hasselman (PSL) e Alexandre Frota (PSDB). Em 21 de maio, uma coalizão rara nos partidos de esquerda, protocolou um pedido assinado pelo PT, PSOL, PCdoB, PSTU,PCB,PCO e UP, com o apoio de 400 organizações civis.

    Mas há mais de 40 pedidos de pessoas comuns, como a brasiliense Neide Lamar que, indignada com o fato do presidente quebrar o isolamento social decretado na sua cidade, foi até o Congresso duas vezes acompanhada do irmão e da mãe.

 Denúncias do superpedido #ForaBolsonaro  

    No dia 30 de junho, foi protocolado o superpedido de impeachment de Bolsonaro. A denúncia resultou da articulação entre os autores da maior parte dos pedidos anteriores. O texto desenvolvido representa um esforço de combinação de fatos e argumentos jurídicos e políticos, utilizados nas diversas petições atualmente sob a análise do presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira.

LISTA DE CRIMES CITADOS NO SUPERPEDIDO:

1. Crime contra a existência política da União. Ato: fomento ao conflito com outras nações.

2. Hostilidade contra nação estrangeira. Ato: declarações xenofóbicas a médicos de Cuba

3. Crime contra o livre exercício dos Poderes. Ato: ameaças ao Congresso e STF, e interferência na PF.

4. Tentar dissolver ou impedir o funcionamento do Congresso. Ato: declarações do presidente e participação em manifestações antidemocráticas.

5. Ameaça contra algum representante da nação para coagi-lo. Ato: disse de que teria que “sair na porrada” com senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), membro da CPI da Covid.

6. Opor-se ao livre exercício do Poder Judiciário. Ato: interferência na PF.

7. Ameaça para constranger juiz. Ato: ataques ao Supremo.

8. Crime contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais. Ato: omissões e erros no combate à pandemia.

9. Usar autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder. Ato: trocas nas Forças Armadas e interferência na PF.

10. Subverter ou tentar subverter a ordem política e social. Ato: ameaça a instituições.

11. Incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina. Ato: ir a manifestação a favor da intervenção militar.

12. Provocar animosidade nas classes armadas. Ato: aliados incitaram motim no caso do policial morto por outros policiais em Salvador.

13. Violar direitos sociais assegurados na Constituição. Ato: omissões e erros no combate à pandemia.

14. Crime contra a segurança interna do país. Ato: omissões e erros no combate à pandemia.

15. Decretar o estado de sítio não havendo comoção interna grave. Ato: comparou as medidas de governadores com um estado de sítio.

16. Permitir a infração de lei federal de ordem pública. Ato: promover revolta contra o isolamento social na pandemia.

17. Crime contra a probidade na administração. Ato: gestão da pandemia e ataques ao processo eleitoral.

18. Expedir ordens de forma contrária à Constituição. Ato: trocas nas Forças Armadas.

19. Proceder de modo incompatível com o decoro do cargo. Ato: mentiras para obter vantagem política.

20. Negligenciar a conservação do patrimônio nacional. Ato: gestão financeira na pandemia e atrasos no atendimento das demandas dos estados e municípios na crise de saúde.

21. Crime de apologia à tortura. Ato: ataques aos mortos e feridos pela ditadura militar.

22. Crime contra o cumprimento das decisões judiciais. Ato: não criar um plano de proteção a indígenas na pandemia.

23. Crimes contra a saúde pública. Atos: propaganda de medicamentos sabidamente ineficaz e propaganda de “kit Covid”, negativa em obter vacinas, ações contra isolamento social para combate a Covid-19.

24. Crime de prevaricação: Ato teve ciência da corrupção e não denunciou; e de denunciação caluniosa ao representar injustamente contra servidor público nos eventos da covaxin.


O que você pode fazer para tirar Bolsonaro da Presidência?

    Além de divulgar e participar das manifestações (a próxima já está marcada para 15 de novembro), usar nas redes sociais a hashtag #ForaBolsonaro e os materiais da campanha, disponíveis no site da Campanha Nacional Fora Bolsonaro.

    Todos e todas podem também pressionar o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para que ele tire da gaveta pelo menos um dos mais de 120 pedidos de impeachment. Para isso, acesse: SUPERIMPEACHMENT.ORG


Fontes: Agência Pública;campanhaforabolsonaro.com.br

“Quem tem fome, tem pressa!”

Na ausência de políticas públicas, Brasil volta ao mapa da fome e sociedade civil se mobiliza 


Por Alvaro Britto


    Infelizmente, no Brasil pós golpe de 2016, a famosa frase de Herbert de Souza, o Betinho, “Quem tem fome, tem pressa!”, dita décadas atrás, nunca foi tão atual. Há poucas semanas, o país mais uma vez ficou chocado com a morte bárbara de uma mãe de 32 anos, que teve 90% do corpo queimado porque, sem dinheiro para comprar gás, usou álcool para cozinhar. Moradora de Osasco (SP), ela deixou órfão um bebê de 8 meses.

    Pouco depois, foi a foto da primeira página do jornal Extra, que revelou famílias procurando em um caminhão restos de carne em pedaços de ossos e pelanca bovinos descartados por supermercados da zona Sul do Rio que seriam levados para fábricas de ração e sabão. 



19 milhões passando fome

    Através de emenda incluída pelo Congresso Nacional em 2010, Constituição estabelece que alimentação é um direito social do povo brasileiro. De lá para cá, entretanto, ao mesmo tempo em que exportações do agronegócio ganharam força, o direito à alimentação tem sido realidade para menos brasileiros.

    A partir de 2020, o aumento da fome no Brasil foi impactado pela pandemia, como em outros países. Mas não é só o efeito da Covid que explica o agravamento do nível de segurança alimentar dos brasileiros, que já vinha piorando antes do coronavírus.

    O alastramento da fome no Brasil é reflexo também do fim ou esvaziamento de programas voltados para estimular a agricultura familiar e combater a fome, além de defasagem na cobertura e nos valores do Bolsa Família.

    São 19 milhões de brasileiros em situação de fome no Brasil, segundo dados de 2020 da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan). A comparação com 2018 (10,3 milhões) revela uma diferença de mais 9 milhões de pessoas. 

    Segundo dados anteriores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é possível ver que em 2013 o Brasil teve o melhor nível de segurança alimentar da série histórica (Pnad), com mais de 77% dos domicílios nessa condição. Em 2014, o Brasil inclusive deixou o chamado Mapa da Fome da ONU.

    Cerca de quatro anos depois, no entanto, a Pesquisa de Orçamento Familiar (2017/2018) do IBGE mostrou que a situação de segurança alimentar era vivenciada por apenas 63,3% dos domicílios pesquisados. Assim, este ano, o Brasil voltou ao Mapa da Fome com o mesmo patamar de insegurança alimentar do início dos anos 2000: quase 10% dos brasileiros não têm o que comer. 


Ação da Cidadania cobra governo no STF

    Fundada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, a Ação da Cidadania nasceu em 1993, formando uma imensa rede de mobilização de alcance nacional para ajudar 32 milhões de brasileiros que, segundo dados do Ipea, estavam abaixo da linha da pobreza. Seu principal eixo de atuação é uma extensa rede de mobilização formada por comitês locais da sociedade civil organizada, em sua maioria compostos por lideranças comunitárias, mas com participação de todos os setores sociais.

    Depois de dez anos sem distribuir cestas básicas, a ONG identificou a necessidade de retomar essa distribuição em 2017. Neste ano, arrecadou mais de R$ 146 milhões e distribuiu alimentos em todos os estados e no DF.  

    E, no final de setembro, resolveu promover também uma iniciativa mais contundente buscando atacar a raiz do problema. Através da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação para obrigar o governo Bolsonaro a implementar políticas públicas de combate à fome, em aliança com estados e municípios.

    O peça jurídica é uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental com Pedido de Medida Cautelar (ADPF), justificada pelas “ações e omissões levadas a cabo pelo Poder Público Federal na gestão da fome no Brasil, por violação a preceitos fundamentais da Constituição da República”, diz o texto encaminhado ao STF. 

Saiba quais são as medidas ajuizadas

    a) revogar a medida provisória que acabou com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão responsável por políticas públicas centradas no combate à fome;

    b) em relação ao Bolsa Família: incluir automaticamente pessoas em situação de pobreza e pobreza extrema a partir da comprovação do critério de renda; e reajustar o valor da renda per capita que define quem pode acessar o programa, assim como os valores dos benefícios transferidos às famílias;

    c) quanto ao Programa Nacional de Alimentação Escolar: que o governo repasse recursos suplementares para a compra de alimentos aos estados, municípios e Distrito Federal; e promovam, junto aos governos locais, ações que garantam, mesmo durante a suspensão das aulas presenciais em decorrência da pandemia, que os estudantes da rede pública de ensino tenham acesso a uma alimentação adequada até o retorno às aulas presenciais nas escolas;

    d) investimento imediato de R$ 1 bilhão no Programa de Aquisição de Alimentos, e que esse recurso seja reajustado anualmente pelo IPCA;

    e) retomada e ampliação do Auxílio Emergencial no valor de R$600;

    f) revogação da aplicação do teto dos gastos e recomposição do orçamento para as políticas públicas de segurança alimentar e nutricional: Programa de Aquisição de Alimentos, de construção de cisternas, assistência técnica rural, distribuição de alimentos, Bolsa Verde, organização econômica de mulheres rurais, e desenvolvimento sustentável de comunidades quilombolas, povos indígenas e comunidades tradicionais;

    g) recomposição dos estoques públicos de alimentos da Conab com ações de controle de preços para evitar falta de alimentos e inflação descompensada;

    h) garantia de acesso da população ao gás de cozinha por meio de uma adequada política de preços;

    i) abertura de crédito adicional no orçamento de 2021 para a realização do Censo e garantia de publicidade dos dados e resultados da pesquisa;

    j) fortalecimento das linhas de créditos para micro e pequenas empresas.


'Solução para fome não é distribuir cesta básica'

    Em entrevista à BBC News Brasil, Rodrigo “Kiko” Afonso, coordenador da Ação da Cidadania, afirmou que é preciso combater a ideia de que a solução para a fome está na distribuição de cestas básicas, que é uma ação emergencial.

    "A gente não pode achar que a solução da fome é distribuir cesta básica, que a solução é pegar alimentos vencidos ou pegar sobras de restaurantes ou de comidas de pessoas da classe média e distribuir para as pessoas", disse.

    Kiko se referiu à declaração do ministro da Economia, Paulo Guedes, que em junho comparou o prato dos europeus ("pratos relativamente pequenos") e dos brasileiros e falou em direcionar alimentos desperdiçados a programas sociais.

    Segundo Kiko, distribuir cestas básicas é uma atuação de emergência. “O governo, ao longo dos últimos anos, criou parte desse problema que a gente está hoje. Não queremos fazer isso, a gente quer que o governo assuma o sua responsabilidade e que a política pública volte a assumir o seu papel". 


“Miséria é imoral. Pobreza é imoral. Talvez seja o maior crime moral que uma sociedade possa cometer”. - Betinho

Fontes: Ação da Cidadania; BBC News Brasil; Observatório do Terceiro Setor; G1