sexta-feira, 17 de junho de 2022

Projeto "Dignidade Menstrual - uma questão de saúde pública" é lançado em Resende

Por Alvaro Britto

Será lançado no próximo dia 24 de junho, às 10 horas, na Câmara Municipal de Resende, o projeto "Dignidade Menstrual - uma questão de saúde pública”, com a presença da deputada estadual Enfermeira Rejane (PCdoB), presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres (CDDM/ALERJ) e autoridades municipais de políticas públicas para as mulheres. 



O evento é uma iniciativa da União Brasileira de Mulheres (UBM) de Resende em parceria com o Núcleo de Gênero e Diversidade Sexual (NUGED) do Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ) - Campus Resende e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES). 

O projeto "Dignidade Menstrual - uma questão de saúde pública" tem por objetivo levantar o debate e levar informações sobre o direito a dignidade menstrual para adolescentes de escolas públicas da cidade de Resende.

Situação de Resende

Resende tem uma população de cerca de 68 mil mulheres, segundo os índices do IBGE de 2010, grande parte delas em idade menstrual. E, embora seja de necessidade básica, os absorventes não fazem parte da cesta básica.

O município de Resende, assim como todo o Brasil, vem sofrendo com os problemas econômicos, levando muitos ao desemprego e as dificuldades financeiras, em especial as mulheres que são as primeiras que sofrem os impactos da falta de oportunidades profissionais.

A dignidade menstrual trata do acesso das pessoas que menstruam a itens que garantirão sua saúde íntima. Será que, frente a dura realidade econômica, todes estão tendo acesso aos itens vitais para sua saúde íntima?

O projeto pretende levantar esse debate e cobrar do poder público seu compromisso com a saúde integral das mulheres e a garantia da dignidade menstrual.

- A abertura do projeto tem muito significado e potência, pois contará com a participação, além da deputada, de nomes que atuam junto aos espaços de políticas públicas para as mulheres do município, o que eleva a discussão. Também estamos ansiosas para começarmos a ir pra escolas e conhecer as perspectivas dos adolescentes em relação ao debate – afirmou a professora Priscila Messias, presidenta da UBM de Resende. 



O que é o projeto?

Público-alvo

Alunos de escolas públicas do município de Resende e região das Agulhas Negras em idade menstrual sem o devido aprofundamento no debate nacional sobre dignidade menstrual, a fim de que compreendam e exijam o cumprimento da lei de distribuição dos absorventes nas escolas municipais e estaduais.

O projeto propõe uma educação menstrual no qual será abordado as questões que tangem o tema como saúde menstrual, dignidade menstrual e direito à programas de saúde integral.

O projeto será direcionado para adolescentes (11 a 18 anos) estudantes de escola pública no município de Resende, podendo se estender para os demais municípios da região das Agulhas Negras.

Por que o projeto?

A dignidade menstrual é um dos focos das organizações não governamentais, do Brasil e do mundo, atentas à saúde feminina e das crianças e adolescentes, não diferente a União Brasileira de Mulheres na cidade de Resende-RJ se preocupa com a dignidade menstrual de meninas e mulheres residentes no município.

No ano de 2020 a entidade se organizou e lançou a campanha de doação de absorventes higiênicos a serem distribuídos para mulheres em situação de rua ou vulnerabilidade social, e, contando com a parceria de muitas mulheres, arrecadou mais de 200 unidades desse item. 

Embora tivesse alcançado o seu objetivo na arrecadação, a UBM-Resende não teve êxito em alcançar o público-alvo, mulheres em situação de vulnerabilidade e privações econômicas. Frente a essa dificuldade, resolveu se aprofundar no tema com o objetivo de entender como a cidade vem abrangendo a necessidade menstrual de suas munícipes.



Objetivos específicos

● Identificar no município de Resende, e região das Agulhas Negras, onde estão os discentes em possíveis situações de pobreza menstrual; 

● Cobrar do poder executivo programas de saúde para crianças e adolescentes que menstruam em relação à saúde menstrual e direitos reprodutivos; 

● Conscientizar a população sobre leis e projetos a respeito da saúde feminina, em especial à dignidade menstrual; 

● Identificar possíveis dificuldades de discentes frequentarem às aulas em seus dias menstruais; 

● Saber se as escolas do município e região das Agulhas Negras oferecem condições necessárias para a higiene menstrual; 

● Saber se nas escolas existem projetos de acolhimento adequado para discentes em seus dias menstruais; 

● Encorajar que as unidades escolares criem ações de acolhimento para discentes em seus dias menstrual; 

● Conscientizar toda a comunidade escolar que dignidade menstrual é questão de saúde pública.

Metodologia

O projeto irá ocorrer em formato de mesa de debate ou roda de conversa, nas quais estarão presentes representantes da CDDM/ALERJ, da UBM Resende e algum profissional que trará o conteúdo sobre saúde e dignidade menstrual. Em seguida, a mesa ou a roda estará aberta às perguntas e considerações dos discentes.

O evento se dará de forma quinzenal, com a presença de representantes das instituições responsáveis pela promoção de políticas públicas, saúde e educação.

Resultados pretendidos 

O UBM-Resende espera, como resultado do projeto, a promoção de informação sobre saúde e dignidade menstrual e buscar a garantia da dignidade menstrual de crianças e adolescentes do município tendo como foco promover um debate a fim de que sejam implementadas políticas públicas direcionadas à saúde, higiene e cuidados menstruais de crianças, adolescentes e adultos.

Monitoramento e avaliação

Ao final de cada evento, haverá uma breve avaliação direcionada aos discentes a fim de obter parâmetros para ajustes durante a realização do projeto.


Estudante organiza “caixinha solidária” em colégio de Resende  

A jovem Gabriela Camassa tem 19 anos e é moradora da Vila Santa Cecília, em Resende. Antes da Pandemia, em 2019, na época cursando o ensino médio no Colégio Estadual Pedro Braile Neto, assistiu na Netflix o documentário curta-metragem "Absorvendo o Tabu”, ganhador do Oscar naquele ano. O filme retrata a Índia rural, onde o estigma da menstruação persiste, mulheres produzem absorventes de baixo custo em uma nova máquina e caminham para a independência financeira. 

- Fiquei um tanto desesperada com a situação das meninas da Índia, que além de não terem uma educação adequada sobre o assunto, também não têm condições de comprar os próprios absorventes. Então comecei a refletir sobre as meninas que faltam aula por não conseguirem comparecer à escola durante os dias em que estão menstruando – revelou Gabriela. 


Percebendo que o problema existia também no colégio onde estudava, ela então resolveu partir para ação e montar uma “caixinha solidária”. 

- Eu montei, e inicialmente contribuí com todos os itens, que foram absorventes, lixa de unha, pasta de dente, hidratante e etc.  Assim que coloquei no banheiro eu deixei com um bilhete dizendo que seria legal se as outras também ajudassem, e assim foi feito – explicou a estudante. 

Segundo ela, “todas as meninas gostaram e usavam a caixinha, foi bem legal fazer parte de algo assim”, informando ainda que o colégio apoiou integralmente e “a diretora inclusive adorou a ideia e recebeu super bem”.

Atualmente, Gabriela Camassa cursa o 1º período do curso de Publicidade e Propaganda na Associação Educacional Dom Bosco (AEDB), onde também faz estágio. Ela pretende retomar o projeto da “caixinha solidária”.

- Agora eu estou pensando em fazer uma dessas na faculdade, com as minhas amigas. Ainda estamos pensando em como será, quais os itens vamos colocar e quando vamos começar com o projeto, mas creio que não é algo que irá demorar, com mais pessoas fica mais fácil - anunciou a jovem resendense.    


Dignidade menstrual: uma urgência para o Brasil

Por Marília Arraes*  



Autora do Projeto de Lei 4968/2019, aprovado pela Câmara dos Deputados em 26/08/2021, que prevê a distribuição gratuita de absorventes para crianças e mulheres em situação de vulnerabilidade e institui o Programa Nacional de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, a deputada federal Marília Arraes enviou ao Pavio Curto o artigo a seguir, onde justifica a necessidade da proposta. O PL foi aprovado pelo Senado em 14/09/2021 e vetado por Bolsonaro em outubro. No dia 10 de março de 2022, o Congresso Nacional derrubou os vetos do presidente. 

Tabu e desinformação

A menstruação é um processo natural do ciclo reprodutivo feminino, começando na puberdade — em média, aos 13 anos — e encerrando por volta dos 50. Apesar de ser algo rotineiro, ocorrendo uma vez por mês (caso não haja fecundação), o assunto ainda é tabu para muitas pessoas, cercado de desinformação e falta de acesso a absorventes e outros itens de higiene.

Uma em cada quatro adolescentes brasileiras não tem um pacote de absorventes à mão quando a menstruação chega. Quase 20% não têm acesso à água em casa e mais de 200 mil estudam em escolas com banheiros sem condições de uso. Garantir a dignidade menstrual para meninas e mulheres brasileiras sempre foi uma das minhas preocupações. 

O relatório Pobreza menstrual no Brasil: desigualdades e violações de direitos, publicado recentemente pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), evidencia a urgência em políticas públicas de saúde para zelar pela dignidade humana de meninas e mulheres que sofrem cotidianamente com a escassez de condições adequadas para o período menstrual.

Falta de acesso e infraestrutura

Pobreza menstrual é uma expressão utilizada para denominar a falta de acesso a produtos de higiene menstrual, de infraestrutura sanitária adequada em casa e na escola e de conhecimentos necessários para esse período do ciclo reprodutivo. As brasileiras que mais sofrem com essa situação são as que vivem em condições de pobreza e vulnerabilidade em ambientes rurais ou urbanos.

O levantamento analisou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de meninas entre 10 e 19 anos por meio da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS 2013), da Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE 2015) e da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2017-2018), totalizando 15,5 milhões de brasileiras.

Em se tratando dos domicílios, cerca de 713 mil meninas vivem sem acesso a banheiros, 900 mil não têm acesso a água canalizada e 6,5 milhões não possuem redes de esgoto em casa. Quando o assunto é infraestrutura escolar, 321 mil alunas estudam em estabelecimentos que não possuem banheiros em condições de uso. Mais de 4 milhões de meninas não possuem à sua disposição algum requisito mínimo de higiene, como papel, água ou sabão.

Problemas de saúde e evasão escolar

Quase 50% das garotas analisadas enfrentam, ainda, algum grau de insegurança alimentar. Cerca de 1 milhão delas vivem em situação de precariedade alimentar grave. Nesses casos, as famílias priorizam o consumo de alimentos em detrimento dos gastos com absorventes e outros produtos de higiene menstrual.

 Quando não há o acesso adequado a esses produtos, muitas mulheres improvisam permanecendo com o mesmo absorvente por muitas horas ou utilizando pedaços de pano, roupas velhas, jornal e até miolo de pão, resultando em problemas que variam desde alergia e candidíase até a síndrome do choque tóxico potencialmente fatal. A saúde emocional também é outro problema sério, ocasionando um aumento de evasão escolar.

 A pobreza menstrual é uma triste constatação de negligência por parte das autoridades para garantia mínima da dignidade feminina. É urgente investimentos em infraestrutura e acesso aos produtos de menstrual. Os absorventes poderiam ser disponibilizados em postos de saúde, por exemplo, assim como já é feito com preservativos e medicamentos — e a taxação de impostos poderia ser reduzida para baratear esses produtos. O saneamento básico em escolas deveria ser uma obrigação, assim como nos lares brasileiros. 


*Marília Arraes é deputada federal (Solidariedade-PE) 

Fotos: Divulgação e arquivo pessoal


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