Por Alvaro Britto*
“Fomos da humilhação a motivo de orgulho graças à nossa luta”, afirmou Terezinha Antero, 77 anos, ao comemorar a publicação, em 20 de setembro, do Decreto Presidencial que declarou de interesse social o Território Quilombola Alto da Serra do Mar, em Lídice, distrito de Rio Claro. Nascida em Passa Três, outro distrito do município localizado entre o Vale do Paraíba e a Costa Verde, no Sul Fluminense, Dona Terezinha chegou ao quilombo aos oito anos de idade, na década de 50 do século XX.
Seu Dito e Dona Terezinha
Ela pertence à família Antero, cuja união com a família Leite através do seu casamento em 1965 com Benedito Leite, atualmente com 81 anos e nascido em Engenheiro Passos, distrito de Resende, deu origem à comunidade quilombola Alto da Serra. As duas famílias são descendentes de trabalhadores escravizados que viviam nas antigas fazendas de café do Vale do Paraíba. Após a abolição, sobreviveram da extração de carvão vegetal, combustível da nascente indústria da região, e colheita do palmito.
Seu Dito
Agricultura familiar
“Com a proibição do carvão e do palmito, buscamos a agricultura familiar, produzindo banana, milho, feijão, coco, aipim, hortaliça. A dificuldade era conseguir vender. Mas mesmo assim a gente fazia esse caminho aqui a pé, o caminho do ouro, pegava o ônibus lá embaixo e vendia a produção em Angra dos Reis”, contou Benedito Leite Filho, presidente da Associação Quilombola Alto da Serra do Mar, onde nasceu e vive há 53 anos. Bené é um dos seis filhos de Dona Terezinha e Seu Dito.
Benedito Filho, o Bené, presidente da Associação
Nos anos 80 começaram as disputas judiciais pelo território. Além reintegração de posse, penhora, leilão e medida cautelar, as famílias sofreram ameaças. Somente em 2003 foi feito um acordo. “O pessoal chegava e dizia “sou dono do pedaço, eu sou dono do outro”. Resistimos com o apoio do projeto Balcão de Direitos da ONG Koinonia, que trouxe advogados e a Defensoria Pública, onde na época atuava a Maria Lúcia, que hoje é superintendente do Incra e está de volta para anunciar o Decreto”, lembrou Bené.
Bené fala na reunião com representantes do Incra/RJ
Reunião da comunidade de Alto da Serra do Mar com dirigentes do Incra/RJ
Orgulho de ser quilombola
No Território Quilombola Alto da Serra do Mar, que possui uma área de 211,98 hectares, 20 famílias vivem da agricultura, piscicultura e criação de animais de pequeno porte. Em 2003, a comunidade se autodeclarou remanescente quilombola, abriu processo de titulação do território em que vivem em 2006 no Incra, foi certificada pela Fundação Cultural Palmares em 2010 e teve sua Portaria de Reconhecimento publicada em 19 de abril de 2016.
Alvaro Britto entrevista Dona Terezinha e Seu Dito
Texto e fotos: Alvaro Britto
* Jornalista
Sem comentários:
Enviar um comentário