domingo, 30 de maio de 2021

" NÃO SOMOS DONOS, SOMOS GUARDIÕES"

Crédito da imagem/acervo pessoal aldeia“Iriri Kãnã Pataxi Üi Tanara”


Texto Mani Ceiba

    Açucena é nome de flor. É uma flor que simboliza a nobreza, a altivez, a elegância. Lendas em várias culturas e até me lembrei de uma música do Ivan Lins que diz: “Minha Açucena, te vejo, A índia vinda das lendas, Iara saída dos rios...”

    Essa Açucena não é lenda. É indígena, guerreira e muito gentil.

    

    Conheci Açucena no meio de uma correria dessas que quem trabalha com questões sociais e diversidade de classe conhece bem. Ela precisava enviar 25 cestas básicas de Cascadura, bairro da zona norte do Rio, para a Bahia, a partir da rodoviária Novo Rio. Sem conhecer o Rio, app de transporte cobrando um valor muito acima do que se imaginava, tentando uma vaquinha, hospedada na casa de amigos... Não, não é um momento isolado na vida de Açucena.  Povos indígenas têm que ir atrás de suas necessidades e buscar resolvê-las como podem e conseguem. Diante do nosso momento político e das questões da pandemia isso ganha um caráter ainda mais trabalhoso.

    Açucena tem 26 anos, um filho de 6 anos e mora na aldeia Pataxó em Paraty, no estado do Rio de Janeiro. Ela veio do extremo sul da Bahia, onde fica a sua aldeia mãe Catarina Paraguaçu. Açucena Pataxó é conselheira do estado e conselheira de saúde da aldeia. 

    Algumas trocas de conversa e fica muito claro que ela sabe do que está falando, e com muita honestidade e clareza da realidade vai me contando que a aldeia Pataxó em Paraty ocupou uma localidade onde seria construído um resort que destruiria toda a mata da região. A aldeia está localizada na rodovia Rio-Santos, km 548. O antigo proprietário que abriu mão dessas terras em troca de outra bem maior, é sempre um fantasma que volta com olho grande. “Medo a gente sempre tem”, diz Açucena. Isso se deve ao que essa aldeia fez com o lugar, despertando o interesse financeiro individual e capitalista em querer tirar algum proveito. 

Crédito da imagem/Arquivo pessoal Açucena

    - O meu povo tem a melhor e mais linda relação com a Mãe Terra. Fizemos a ocupação com o intuito de cuidarmos pra evitar poluição e desmatamento. Guiamos os turistas e frequentadores. Estamos pra cuidar e não somos donos e sim guardiões! – esclarece Açucena Pataxó. 

    A Aldeia “Iriri Kãnã Pataxi Üi Tanara”, que significa “Minha aldeia é a natureza”, conseguiu transformar essa localidade em um espaço que respeita a natureza, mantém equilíbrio com o modo de vida e ainda é aberto a turistas. Antes da pandemia, eles podiam ter contato com o estilo de vida e costumes e ainda contribuir com a aldeia, comprando artesanato indígena, pagando por um lugar para deixar o carro e dormindo dentro da reserva, por exemplo. Duas fotos que Açucena me envia e já sinto o quanto o lugar é especial. Não é à toa que se alguém jogar na barra de pesquisa, paraíso é a palavra mais usada por quem já esteve lá.

    A aldeia enfrenta desafios permanentes por conta dessa demarcação do território e a ameaça constante onde os “não donos de terra se dizem donos de terra indígena” e a luta pra manter os costumes e cultura.

    E o desafio de hoje é manter a aldeia em isolamento e com sustentabilidade. Ele é ainda maior já que a aldeia dependia das vendas de artesanatos e visitas turísticas. Com os cuidados com a prevenção a Covid, ficou desestabilizada com a falta de apoio. 

    A aldeia tem uma página oficial no facebook para divulgar seus trabalhos. https://www.facebook.com/iririkanapataxiuitanara/ 

    E assim que a pandemia passar, a possibilidade de nos vermos por lá é bem grande!

Crédito da imagem/ arquivo pessoal Açucena

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