quinta-feira, 17 de junho de 2021

SOS Manas, mulheres para toda obra!

Crédito da imagem/ Caroline Silva

“De tijolo em tijolo se repara o mundo”

 Por Julia Duppré

Gabriela Castro se apresenta como soldadora, eletricista, artista e Fernanda Dias é a empresária a empreendedora da dupla. Com o início da pandemia, o trabalho de recreadora em eventos paralisado, sem previsão de novos contratos, Gabriela mirava o horizonte sem expectativas, até que Fernanda com o seu olhar perspicaz fez uma previsão “já que as pessoas estão dentro de casa, e vendo que ela precisa de reparos, e se montássemos uma empresa para fazer esses tipos de serviços?”. O serviço foi oferecido a amigos próximos, familiares, o primeiro post foi feito e já no seguinte dia tinham 800 curtidas com muitos comentários entusiasmados!

E assim surgiu a “S.O.S Manas” uma empresa que faz qualquer tipo de reparos em casas; elétrica, solda, pintura, montagem de móveis, jardinagem e otras cositas mas. Depois de 7 meses de muito trabalho, a pequena maletinha de ferramentas fomentou a compra do carro que está abastecido de sonhos, para adquirir ferramentas mais robustas e parcerias para o projeto “Reparo Social”, um lembrete para as manas de sua ancestralidade e sua origem pobre, em que mensalmente, atuam com 100% de gratuidade de mão-de-obra para reparo em casa de mulheres pretas. “Se tivéssemos uma parceria com as empresas de material de construção para auxiliar essas mulheres e famílias em vulnerabilidade, conseguiríamos ampliar esse atendimento e proporcionar melhores condições de vida a elas”, sentenciou Gabriela.

“O nosso primeiro post, foi feito em uma época em que ocorreu um feminicídio, e nos pareceu que o olhar sob a nossa prestação de serviço mudou, recebemos mais comentários nos parabenizando, nos acolhendo e nos incentivando a continuar”, avaliou Fernanda. A triste realidade da violenta opressão que esse ideário de sociedade brasileira machista, patriarcal e heteronormativa exerce sobre milhares de indivíduos culminando com a sua morte. Existem situações que as manas vivenciam o olhar atento de muitos homens e algumas mulheres durante o serviço, mas “nós entendemos que como nos colocamos nesse lugar, estamos abertas também para iniciar essa comunicação e mudar os paradigmas. Damos atenção à cliente, fazemos questão de demonstrar o que estamos fazendo, tentando ensinar para elas como serem protagonistas em fazer alguns consertos!”, explicou Gabriela, lembrando que a intenção não é mudar o mundo e sim, acrescentar outras formas de analisar uma situação de desigualdades sem ser deselegante; “tivemos uma situação que a peça que a cliente comprou estava com defeito, e embora insistíssemos com ela, o filho falava que estávamos fazendo errado. Porque tem essa insegurança das pessoas acharem que eu não sei o que estou fazendo! Mas tenho certificados e sou formada em solda e eletricista, mas as vezes parece que isso não basta. Muitos homens que prestam esse serviço nunca colocaram o pé em uma escola, mas recebem mais aceitação do que nós”. “De repente até existe uma retaliação, mas a gente não enxerga isso. Nós queremos trabalhar, fazer o nosso melhor para a nossa cliente e aumentar a nossa rede”, completou Fernanda.

Existe uma preocupação muito grande tanto em preservar as funcionárias da empresa, quanto com a cliente, já que cerca de 90% da clientela é de mulheres, idosas que moram sozinhas. Gabriela disse que antes de ir a casa do cliente, algumas informações são confirmadas e que o serviço prestado só termina quando o local fica limpo. “Agora com o Covid-19 não deixamos de usar a máscara em momento nenhum, muito álcool em gel, a preocupação e o cuidado é tanto que estamos atendendo e não tivemos ninguém da nossa equipe contaminada”, ressaltou Fernanda.

As páginas do Instagram e Facebook já foram atacadas por haters, mas a própria comunidade seguidora do S.OS. Mana aparece para dialogar com posts abusivos. Segundo Fernanda após a publicação de um flyer reafirmando a condição da empresa ser de mulheres pretas, um comentário foi de que “era desnecessário falar que éramos pretas, que isso não implicaria uma diferença”. “A gente até chegou a pensar em responder algo através de nosso post pessoal, mas nem precisou, as manas que nos seguem conseguiram assertivamente consertar a situação de forma pacífica, dialogando”.

A cada atendimento, tem-se a certeza de que paradigmas estão sendo quebrados e cada nova casa vai se consolidando uma grande rede, cujos tijolos são a alegria no olhar dessas manas, a gentileza e atenção com cada detalhe durante a nossa conversa, mas que há a necessidade de fomentar parcerias para conseguir aumentar a estrutura e ajudar mais mulheres a se tornarem, não só donas do lar, mas protagonistas das suas histórias através de sua relação com os problemas de estrutura da casa, disso não há dúvida.  Será que na nossa região existe empresas preocupadas com o social para embarcar nessa jornada de reparar as realidades?


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