OPOSIÇÃO NAS RUAS
Militantes de esquerda têm propostas diferentes para derrotar o governo
Por Alvaro Britto e Clovis Lima
24 de julho foi o quarto sábado desde 29 de maio em que a oposição de esquerda promoveu manifestações pelo impeachment de Bolsonaro. São defendidos, ainda, a vacinação em massa e o auxílio emergencial de R$ 600, entre outras bandeiras de luta. Também houve protestos em 19 de junho e 3 de julho. “Estamos nas ruas porque esse governo é mais perigoso que o vírus!” – esse é o discurso comum dos partidos e movimentos populares que voltaram às ruas em maio.
Mesmo havendo unidade e consenso em relação à importância das mobilizações populares realizadas em centenas de cidades em todo o país, utilizando máscaras e álcool 70% - inclusive distribuídos durante as atividades – e tentando manter o distanciamento social, os militantes têm propostas diferentes para derrotar o governo.
Para conhecer e trazer esse importante debate sobre os melhores caminhos para dar um fim à atual política genocida, de extrema-direita e neoliberal de Bolsonaro, o Pavio Curto entrevistou lideranças de partidos de esquerda e movimentos populares que participaram ou apoiaram as manifestações de 24 de julho em Resende, Porto Real e Barra do Piraí, na região Sul Fluminense.
Impeachment é possível
Odete Amaral, que é professora e presidente do PT de Resende, é a favor do impeachment já. “Bolsonaro na presidência significa mais mortes, fome, desemprego e risco à democracia”. Ela acredita que o afastamento possa ser aprovado com o reforço da mobilização popular nas ruas e nas redes, para pressionar o Congresso. “As denúncias reveladas na CPI do Senado vão obrigar os parlamentares a se posicionarem”, avalia Odete.
A também professora Roseneia de Oliveira, da APMR e filiada ao PDT, concorda com o afastamento de Bolsonaro, “por tudo que a CPI já revelou e pelo genocídio do povo preto e indígena, pela fome”. Ela também denunciou que “a polícia está sem limites e as políticas públicas locais diminuíram, com menos defesa dos direitos das mulheres e baixa qualidade da alimentação nas escolas”. Roseneia acredita na aprovação pela pressão popular, “já que 2022 é ano eleitoral e os deputados e senadores não vão querer afundar junto com Bolsonaro”.
Bandeiras de luta
Eulália Citroni, que é dirigente do SEPE e do PSOL de Resende, considera que o impeachment “é fundamental para reduzir as perseguições aos movimentos sociais, as medidas neoliberais e diminuir as mortes pela Covid 19”, mesmo considerando ser muito difícil obter maioria no Congresso para aprová-lo, já que “o capital é beneficiado pelas medidas neoliberais”. Eulália defende que o movimento de rua deve continuar, “mas a esquerda precisa construir bandeiras unitárias de luta antes de pensar em nomes para a disputa eleitoral”.
O professor e presidente do PCdoB de Resende, Elon Viana, também é a favor do impeachment. Para ele, “existem provas concretas de crime de responsabilidade e o afastamento de Bolsonaro seria uma garantia de manutenção da democracia necessária para a luta do povo contra os retrocessos”. Elon acredita que o Congresso precisa dar a resposta que a sociedade quer, pois “Bolsonaro está isolado”. Também considera fundamental a mobilização nas ruas para “a população demonstrar sua indignação contra este desgoverno”.
Luís Felipe Cesar, ambientalista e dirigente da Rede Sustentabilidade, entende que “a cada dia que passa, Bolsonaro causa danos de caráter irreversível, que envolvem a perda de vidas, as condições do ecossistema e riscos à democracia. Como o governo é controlado pelo Centrão, quando os deputados perceberem a pressão popular e o risco ao próprio funcionamento do Congresso, o impeachment poderá ser aprovado”. Na sua opinião, a mobilização é fundamental para a população deixar claro o seu basta ao atual governo.
Em Barra do Piraí: Fora Bolsonaro!
Cida Figueira, presidente do PT de Barra do Piraí, defende o impeachment porque “é um desgoverno genocida que acabou com todas as políticas públicas que construímos. Já são mais de 550 mil mortos e o povo quando não morre de fome é de doença ou de bala”. Segundo ela, “Bolsonaro só vai cair quando formos milhões nas ruas. Para tentar se livrar, ele comprou o Centrão. O impeachment tem que ser agora, mas não basta as entidades, partidos, o povo tem que estar na rua”.
Também de Barra do Piraí, a professora e militante petista Fátima Mendes vai na mesma linha.
“Eu acredito muito no movimento de rua, porque quem faz a mudança é o povo organizado, é o povo participando, são as entidades juntas com outras entidades. O processo é difícil e não acontece rápido, mas a gente tem que perseverar. Aí as coisas acontecem. A gente tem que pensar que a força do povo é uma força maior e é possível essa mudança pela força do povo. Temos que estar nas ruas lutando pela saída desse governo genocida já, agora”.
Cassação da chapa
Gabriela Lima, estudante de Serviço Social e candidata do PT à Prefeitura de Resende, em 2020, defende a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão, com a convocação de novas eleições. Mas considera muito difícil a conquista da cassação ou do impeachment. Para ela, “é importante a continuidade da mobilização e organização popular, aumentando o desgaste do governo com a divulgação das denúncias, dificultando a reorganização da base bolsonarista, aumentando assim as chances de vitória da oposição em 2022, com a candidatura de Lula”.
Na opinião do militante do MNU Sul Fluminense, Clovis Alves, também presidente do Kilombo NGangu Clube de Resende, “já há elementos jurídicos para o impeachment, mas politicamente pode ser melhor derrotar Bolsonaro nas urnas para evitar a sua vitimização. A saída ideal seria a cassação da chapa para evitar mais mortes, a fome, o genocídio contra o povo preto e indígena. É o pior governo do período democrático”, avaliou Clovis, que considera muito difícil a aprovação do afastamento “porque o capital controla a maioria do Congresso”.
Fabíola Lima, que é do Comitê Lula Livre do Sul fluminense e participou da manifestação em Porto Real, também é a favor da cassação da chapa Bolsonaro-Mourão, “porque é uma política de governo que deve ser retirada. Não adianta só tirar Bolsonaro”. Entretanto, ela acha muito difícil. “O governo estrategicamente está cooptando os deputados e nomeando seus aliados no Supremo Tribunal Federal. Só mesmo com o povo na rua pressionando o Congresso para que retirem o apoio ao governo poderemos ser vitoriosos”.
O teólogo católico Rômulo Saloto, presente no protesto de Resende, entende que “a direita é a maior interessada no impeachment para ‘limpar a cena do crime’ e tentar preparar uma ‘terceira via’, já que hoje o afastamento de Bolsonaro significaria Mourão na presidência”. Ele considera fundamental manter a mobilização popular em defesa da democracia, inclusive com a volta às bases, “para educar os eleitores de Bolsonaro com o ‘cadáver em cima da mesa para que sintam o cheiro’, e reavaliem o voto de 2018 para apoiar a esquerda em 2022”.
Posição semelhante tem o advogado Valdo Gomes. Na opinião dele, “com o impeachment, Mourão pode ser a ‘terceira via da direita, pois terá a máquina do governo, fará acordo com a grande mídia e manterá a política neoliberal, tudo com o apoio dos militares”. Para Valdo, “o Centrão não admite o impeachment e por isso ele não passa no Congresso”, mas a mobilização nas ruas deve ser mantida com os atos mais espaçados e maior presença da oposição nas redes sociais.
Também o teólogo evangélico Luís Fernando avalia que “o impeachment agora pode ser pior politicamente para o povo, pois Mourão assume com cara limpa. Com Bolsonaro, o governo se desgasta a cada dia”. Ele ainda considera mínima a chance de passar o impeachment. “Arthur Lira e o Centrão controlam a maioria e para o capital não interessa tirar Bolsonaro agora. A mídia joga cortina de fumaça, pois se quisessem mesmo já tinham tirado”. Para Luís, “a terceira via está enfraquecida e a tendência é polarizar, aumentando as chances de Lula em 2022”.
Importância das mobilizações
Gabriel Rios, que é trabalhador, estudante e militante do PT, defende o movimento nas ruas e nas redes para desgastar Bolsonaro até a eleição de 2022. “Colocar Mourão agora é trocar seis por meia dúzia. Ele manterá a política neoliberal de privatizações e reformas contra os direitos dos trabalhadores. E também não acho possível a cassação da chapa”, afirmou ele, que entende que “a esquerda precisa qualificar sua atuação, conversar com a juventude, mostrar que nos governos do PT havia emprego”.
O advogado e presidente do PSB de Resende, Rogério Coutinho, afirma ser a favor do impeachment, mas tem certa preocupação. “Tirar Bolsonaro e deixar Mourão pode fortalecer os militares no poder e o Centrão. O impeachment só vai acontecer com muita mobilização da sociedade e isso está difícil neste momento da Pandemia. Assim, vejo as eleições de 2022 como a oportunidade de virar o jogo com eleição de Lula e de parlamentares que defendam a Democracia e o fortalecimento das instituições. E principalmente que representem a vontade popular”.
Marcos Braga, músico e que participou da manifestação em Barra do Piraí, também não acredita no impeachment, mesmo com as denúncias da CPI e os movimentos de rua, “devido ao apoio que Bolsonaro obteve do Centrão e também porque está com o exército ao seu lado”. Na sua opinião, o mandato vai até o final, “por isso vamos ter que eleger alguém em 2022 e retomar nosso direito de expressão. Tenho medo da censura. Há músicos que cantam e tocam Zé Ramalho, Chico, Alceu e depois vomitam que são a favor do Bolsonaro”.
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