terça-feira, 9 de novembro de 2021

CONSCIÊNCIA NEGRA: com a palavra, os movimentos populares

 Por Alvaro Britto 

Nos mês do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, o Pavio Curto entrevistou lideranças de diversas frentes de luta do movimento negro. Conversamos sobre temas como a importância do resgate da memória de Zumbi e Dandara, as principais demandas e bandeiras de luta do povo negro, o papel das redes sociais na denúncia dos casos de racismo, o espaço aberto para os negros na chamada grande mídia, o triste momento que atravessa a Fundação Palmares e a participação do movimento negro nas eleições de 2022, entre outras questões. 

O resultado das entrevistas foi tão relevante que resolvemos dividir as respostas em três reportagens, de forma a destacar o rico conteúdo de cada fala. Nessa primeira parte, abordamos a diversidade do movimento negro através de várias entidades, coletivos e organizações. Na segunda, focamos a luta das comunidades quilombolas e na terceira, também veiculada através da rádio Pavio Curto, entrevistamos uma liderança da juventude negra. 

A coalizão faz a força

Diante de tantos ataques, uma boa notícia. Preservando e, mais que isso, fortalecendo a diversidade do movimento negro, com suas inúmeras frentes de atuação e segmentos específicos, foi criada, no início de 2019, a Coalização Negra por Direitos, formada por inúmeras organizações representativas do povo negro de todo o país.  

Em seu manifesto de lançamento, a Coalização anuncia que ‘O povo negro tem um projeto para o Brasil. Um projeto baseado na potência transformadora de mulheres, homens, jovens, pessoas LGBTQI+, favelados e periféricos, aquilombados e ribeirinhos, encarcerados e em situação de rua, negras e negros que formam a maioria do povo brasileiro’.  

Segundo o documento, ‘Este projeto de país, voltado para um futuro justo e inclusivo para todas e todos os brasileiros, se torna agora um compromisso formal assumido por organizações do movimento negro espalhadas por todo o território nacional’. Atualmente, a Coalização Negra por Direitos é composta por 233 entidades, entre organizações negras, parceiras e aliadas. Dentre elas, 19 integram a sua secretaria operativa, inclusive algumas cujos representantes foram entrevistados pelo Pavio Curto

A Carta Programa da Coalização traz 14 princípios e 25 reivindicações e exigências que representam o conjunto de pautas dessa ampla articulação.  A íntegra da Carta Programa, a relação das organizações participantes e muito mais informações e conteúdos em textos, fotos e vídeos sobre a Coalizão Negra por Direitos você pode encontrar em www. coalizaonegrapordireitos.org.br


Sonia Freitas: ”Como nossos ancestrais, somos teimosos. Não morreremos sem lutar!” 


Histórica militante do movimento de mulheres negras de Resende, Soninha, como é conhecida, atua na organização Agentes de Pastoral Negros (APNs) e na Coordenaria de Igualdade Racial da Prefeitura Municipal. 

“Estamos vivendo um momento muito difícil onde todos os dias temos que nos reinventar, até mesmo nossa própria existência como seres humanos. Resgatar, lembrar e reafirmar a luta de Zumbi e Dandara será, especialmente esse ano, um marco na nossa luta. Pois adoecemos, perdemos entes queridos, vimos nossas políticas públicas serem desmanteladas. Na verdade vimos o Brasil descer ladeira abaixo. Os ataques a Zumbi, Dandara e outras personalidades que fizeram a diferença nesse pais demonstram que estavam certos, ou no mínimo faziam sentido suas ações, caso contrário tais ataques não aconteceriam. Como nossos ancestrais, somos teimosos. Não morreremos sem lutar. Trazemos conosco uma ousadia histórica que não nos deixa desistir.”

“A maior demanda do povo negro no momento, podem até não acreditar, mas é vencer a fome, o desemprego a miséria. Temos assistido a degradação da população mais pobre, em especial, a população negra. Resgatar a dignidade dessas pessoas, elevar a autoestima é preciso. Com certeza há demandas específicas das mulheres, LGBTQIA+, juventude, idosos, etc. Não podemos esquecer das pautas específicas das mulheres negras que não são contempladas na luta geral do Movimento de Mulheres.” 

“Nossas bandeiras de luta nunca mudaram, até porque não as alcançamos. Ao contrário disso, essas bandeiras são acrescidas de outras. O sistema racista não nos dá trégua. Quando estamos vencendo uma batalha, vem nova guerra. Ao mesmo instante que lutamos contra o racismo, é fundamental que lutemos pela promoção da igualdade. Mostrar a essa sociedade que vidas negras importam, que nossa juventude negra tem o direito de ir e vir sem ser assassinada, que as instituições desconstruam o racismo que as norteiam. São onze anos da Lei 10.639 e até hoje as ‘escolas’ não se adaptaram para implementá-la. As bandeiras são muitas e, praticamente todas são prioritárias.”

“Da mesma forma que as redes sociais têm dado publicidade aos casos de racismo, também acordaram os monstros racistas, fascistas e todos os ‘istas’ que conhecemos. Mudança de consciência? Essa sociedade nem admite que é racista, vive em constante negação e aproveita as redes sociais para destilar venenos racistas e se esconder. Mas por outro lado, nós também usamos as redes sociais e isso têm nos ajudado a mostrar a verdadeira face dessa sociedade. Mudança de consciência da sociedade sobre o racismo ainda vai levar um longo tempo.”

“Podemos afirmar sem medo que a ocupação desses espaços (na mídia) foi mais uma conquista dos profissionais que são altamente capacitados, pressão do mercado e cobrança dos movimentos sociais negros. E a grande mídia age de acordo com as conveniências, ou seja, faz o que é bom para ela, o que dá resultado positivo. Na verdade essas portas quase foram arrombadas para que esses profissionais negros e negras lá estivessem.”

“Sérgio Camargo à frente da Fundação Palmares é um projeto muito bem arquitetado pelo sistema racista, hoje representado pelo presidente da República.  Esse projeto está em andamento há muito tempo, mas nesse momento específico, ele aflorou. É um projeto calcado em retrocessos, extermínio da população negra e indígena, humilhação aos pobres, etc. Para uma sociedade construída sobre um pilar racista nada melhor do que um dos ‘nossos’ a fazer esse papel de desconstrução de nossas pautas e, até mesmo de nossa história. Estamos assistindo a volta do capitão do mato. Enfrentar Sérgio Camargo é dizer não a tudo aquilo que nos mata.” 


“Muitas vezes o novimento negro tem suas pautas unificadas, mas com vertentes políticas partidárias diversas. Em várias partes do Brasil a discussão de que é preciso lançar candidatura negra com pautas específicas do movimento está sendo feita. Mas na maioria das vezes, essa candidatura é pessoal.” 

“Resistir é preciso.  Renovemos nossas esperanças para 2022!!”


Yuri Willon: “A luta antirracista é de caráter coletivo e não individual” 



Jovem universitário, Yuri é militante do Coletivo Seja, que é um movimento LGBTQIA+ de mobilização social e afirmação da diversidade que funciona desde julho de 2019. Ele também é membro do Conselho Tutelar de Porto Real. 

“É muito importante resgatar a memória de luta e resistência do povo preto, romper com o pensamento abissal da brancura que se apresenta como salvadora e coloca o povo preto no lugar da passividade. É fundamental exaltar nosso protagonismo no enfrentamento ao racismo e reafirmar nossa corporeidade nessa arena de disputa e resistência.”

“Acredito que nesse cenário pandêmico o maior enfrentamento da população preta seja o emprego informal ou a falta do mesmo, onde o Brasil voltou para um cenário assustador de fome, o Estado opera pela omissão, no deixar morrer. Quando falamos sobre LGBTQIA+ se faz necessário deixar claro de quem estamos falando, pois as pessoas são específicas com demandas também específicas, a população trans e travesti acaba sendo a linha de frente vítima desse (cis)tema de opressão que a coloca sujeita à subalternidade.”

“O Coletivo Seja é um coletivo LGBTIA+, logo todo conteúdo e atividade proporcionada por nós é destinada à esse público alvo. Abordamos a questão racial através da ótica de gênero e sexualidade, mas nos colocamos firmemente na luta antirracista na promoção dessas práticas anti-repressivas.”

“Acredito que sim, mas (a rede social) não alcança toda a população. A luta antirracista tem que acontecer diariamente por todos nós em todos os espaços, estando sempre preparados para identificar e denunciar.”

“A luta antirracista é de caráter coletivo e não individual. Uma pessoa preta estando em lugar de destaque, apresentando um telejornal é grandioso e potente, significa muita representatividade, mas não muda a vida de todo um coletivo que é discriminado, assassinado, encarcerado diariamente. O povo preto ainda continua escravo da fome e do desemprego. Se a grande mídia não utiliza seu poder pra mudar essa realidade, não existe tomada de consciência.”

“Um grande retrocesso (Sergio Camargo na Fundação Palmares), símbolo de desmonte, alagamento e banalização do movimento negro brasileiro.”

“Com certeza, nossa luta é anti-Bolsonaro, queremos sua derrubada já, e de todos os seus aliados. É muito importante fortalecer e incentivar candidaturas pretas, femininas e LGBTIA+.”

“A branquitude ainda não se reconhece enquanto específica, não se entende enquanto raça, sempre se comportou como salvadora de uma falsa liberdade privando o preto de ser protagonista de sua própria luta. Minha luta é por emancipação e autonomia do corpo preto, corpo este vivo que produz, celebra e conquista. Que nossos saberes sejam válidos, que nossa corporeidade seja exaltada e que nossa cultura seja nossa. Que nossa consciência seja cada vez mais preta.”


Cloves Alves: ” Há uma reparação histórica a ser feita pelo Estado Brasileiro”



Empresário, repórter fotográfico, estudante de direito e militante do Movimento Negro Unificado (MNU) do Sul Fluminense.  Fundador e atual presidente do Kilombo Ngangu Clube e instrutor do Programa Lapidando Pérolas e Diamantes Negros.

“Lembrar Zumbi e Dandara é lembrar da luta da nossa ancestralidade e reverenciar aqueles e aquelas que lutaram, deram suas vidas, para a libertação de um povo escravizado. O 20 de novembro, dia do assassinato de Zumbi, um dos nossos primeiros guerreiros na luta contra a escravização é lembrar de tantos outros e outras que posteriormente travaram essas lutas. Comemorar e lembrar essa data é extremamente importante para que as barbáries da escravização não se repitam e dizer claro e em bom tom que há uma reparação histórica a ser feita pelo Estado Brasileiro. Paulo Freire representa a inclusão e o crescimento social não só de negros e negras, mas de toda a população pobre em vulnerabilidade escolar. É a inclusão social através da educação.”

 “As nossas principais demandas são respeito e reconhecimento.  E preciso oportunizar emprego de qualidade e remuneração justa, cumprir e trabalhar a atenção básica previstas na constituição (saúde, moradia digna, educação e etc...).”

“Nossa principal bandeira será sempre a luta por equidade e o fim do racismo. Implementação de políticas públicas que atendam as demandas da população negra. Que visem o fim da criminalização, mortandade e o encarceramento do nosso povo.”

“De fato as redes sociais trouxeram essa visibilidade aos casos de racismo, mas infelizmente pouco se tem punido. Há várias brechas nas leis, o que dificulta a punição à altura e em conformidade do crime cometido, muitos inclusive reduzidos de racismo que é crime, a injuria racial. Não percebo grandes mudanças positivas na nossa sociedade. Infelizmente houve um grande retrocesso e perdas por conta do atual presidente da República e uma política de negacionismo e conservadorismo extremo, que desqualifica as lutas de classes, inclusive no combate ao racismo.” 

“Ainda é muito pequena essa abertura (na mídia), na verdade esses espaços ocupados são fruto de muito ‘pé na porta’ de muita luta e qualificação ao máximo. Nos tornamos um grande mercado consumidor e cada dia mais exigente de produtos e serviços que atendam nossas demandas, nossos gostos, estilos e formas de viver, e isso tem forçado uma abertura nesses espaços.  As novelas retratam uma romantização da vida dos negros e negras, principalmente no período escravocrata, que em nada representa a realidade da vida dos negros no Brasil.”

“Sergio Camargo representa o que há de pior em um ser humano. É um preto a serviço dos brancos racistas, um verdadeiro capitão do mato. Um ser vil que vende seu povo por poucas moedas, um Judas Iscariotes. Ele representa um verdadeiro retrocesso na luta contra o racismo e na representatividade preta.  Pior que um branco racista é um preto racista, um preto que não reconhece a luta do seu povo e nem as mazelas da sociedade que ainda assolam e empurram para a miséria uma população que ajudou a construir a riqueza do País e que não tem sequer uma alimentação básica e digna.”

“Ter candidaturas negras é primordial para por na mesa políticas públicas que atendam as nossas demandas. Infelizmente ainda nos falta a estrutura e espaço necessário para ampliar esses debates, mas já alcançamos grandes avanços para 2022.”

“O dia da consciência negra é um dia de celebração e conscientização sobre qual foi, é e será o papel do negro na sociedade brasileira. Um dia de conscientizar negros e negras, não negros sobre a importância de se eliminar o racismo estrutural, dizer que ele existe, é maléfico e precisa ser extirpado do seio da sociedade. Trabalhos e oportunidades de debates propostos pelo Pavio Curto contribuem para que nossas vozes cheguem até as pessoas e que de alguma forma contribui para a nossa conscientização e principalmente no combate ao racismo. Vidas negras importam, somos nós por nós e ninguém vai largar a mão de ninguém.”


Iara  Petrilio: “A bandeira que insiste em ser prioritária é: PAREM DE NOS MATAR!”



Natural de Volta Redonda, moradora de Resende e mãe do Ian e do Wilquer, Iara é funcionária pública concursada, atualmente licenciada. Empreendedora, é militante da União de Negros pela Igualdade (UNEGRO). 

“Diante o cenário atual é fundamental que exaltemos o 20 de novembro, exaltemos toda luta travada antes de nós. Levantarmos nossa voz e bandeira para que não esqueçam que estamos aqui e continuaremos de pé, seguindo os exemplos de luta e resistência deixados. “

“ As demandas do povo negro continuam as mesmas de antes da pandemia e passam pela garantia dos direitos básicos: trabalho, saúde e educação públicas de qualidade. Coisas que só se agravaram com a pandemia, que afetou a população negra em maior número. E dentro da população negra os mais afetados são os homens negros. Desemprego, morte por homicídio, população carcerária. Hora de pararmos, valiarmos , reavaliarmos nossa caminhada. Não é parar com as demais pautas, mas entendermos que são nossos maridos, filhos, pais, irmãos, amigos que estão sendo mais afetados nesse sistema excludente e genocida.”

“A bandeira que insiste em ser prioritária é: ‘PAREM DE NOS MATAR!’.  Fisicamente, intelectualmente, esteticamente, culturalmente, religiosamente. “

“Não acredito na mudança de consciência da sociedade por conta da visibilidade. Pois nem todos são punidos, nem todos as denúncias têm continuidade, nem todas tem a mesma visibilidade e repercussão. Até nisso há um processo em que eles decidem qual vítima merece repercussão. Inclusive acho desnecessário o termo ‘injúria racial’,  pois é nele que os racistas se apegam para penas leves ou nulas.  Acredito que o acesso à informação e às políticas públicas criadas e garantidas através das ações e políticas afirmativas são os reais fatores para essa mudança de consciência.”

“Em relação ao espaço para negros na grande mídia, acredito que inicialmente foi apenas jogada de mercado.  Mas com as políticas afirmativas, mesmo que discretamente, ainda com barreiras, estamos ocupando espaços antes negados e a partir daí iniciou-se uma tomada de consciência, ainda discreta e como jogada de mercado.”

“Não que ele seja uma exceção, mas penso que significa que é hora do movimento reavaliar posturas e posicionamentos. Para mim, Sérgio Camargo é a figura do capitão do mato, combatido por Zumbi, por Dandara e tantos outros.  Não conheço a trajetória  desse senhor, mas conheço outros ‘Sergios Camargos’ que se criam dentro dos movimentos e que são cooptados pelos senhores brancos.  Nos espantamos por ele estar na Fundação Palmares, mas não esperava nada diferente do eleito presidente. Me espanta muito mais negros e negras conhecidos, que estão na luta há mais tempo que eu, se tornarem capitães do mato.  Momento de reavaliação, de identificar e tomar medidas antes que sejam usadas contra nós.” 

“Acredito que ainda não (haja candidaturas do movimento negro), a não ser para presidente que não há o que discutir. Mas espero que diante do cenário atual seja seriamente levado em consideração e que as vaidades sejam deixadas de lado.  Os demais cargos da disputa eleitoral também devem ser muito bem costurados com e para a luta.”

“O movimento deve se lembrar o que nos une. E isso é muito maior que qualquer vaidade, qualquer pessoa, benefício ou cargo.  Temos que nos reorganizar e voltar ao básico, a tarefa de casa.  Como estão as políticas públicas em nossa cidade? Nos últimos anos, por exemplo, o feriado de 20 de Novembro não foi respeitado. Quantos ‘Sérgios Camargos’  estão à frente de pastas importantes com discursos e bandeiras que não são nossos?  Reforçando: momento de reavaliar, reorganizar e garantir que outro genocida não ganhe a eleição e continue nos matando.”


Sebastião de Oliveira: “A maior demanda é a luta contra a desigualdade”



Atualmente morador de Resende e servidor público municipal da Prefeitura de Barra Mansa, Sebastião de Oliveira é militante histórico do Movimento Negro no coletivo Agentes de Pastoral Negros (APN). 

“É muito importante resgatar a memória da luta do povo negro no Brasil, ressaltando ícones como Zumbi e Dandara que foram resgatados pelo movimento negro para a sociedade brasileira. Nem a academia nem a imprensa reconheciam Zumbi e Dandara. Foi o movimento negro que os trouxe para o panteão dos heróis da nação. Importante reforçar essa imagem de todos os negros que lutaram e lutam contra a escravidão e o racismo. Assim como o mestre Paulo Freire, que com a sua pedagogia do oprimido trabalhou pela emancipação dos empobrecidos. O combate à extrema-direita, que injuria esses ícones principalmente pelas redes sociais, será no dia a dia para desmentir essas mentiras. Isso é um aspecto da luta de classes.”

“ A maior demanda é a luta contra a desigualdade. A sociedade precisa ser convencida de que é insuportável a desigualdade gerada pelo racismo que se reflete nas questões sociais. Os quilombolas são vítimas, já que no processo de exclusão gerado pela escravidão, eles ficaram mais isolados ainda nos grotões do Brasil. Até 1988, por exemplo, os kalungas, em Goiás, não eram reconhecidos pela sociedade. É uma desigualdade absurda, em que pouquíssimos detém a maior parte da renda, das propriedades e dos direitos. Essa é a bandeira que o movimento negro precisa trazer para si, junto com o conjunto da sociedade. A luta contra o racismo também é central. Cada vez mais o racismo no Brasil, que sempre existiu, fica mais explicito nas redes sociais, nos jornais e na TV. Precisamos é dos mecanismo de combater o racismo. O STF acaba de igualar a injuria racial ao crime de racismo. Isso é importante, mas os negros precisam ter consciência de que sofrem racismo e não apenas discriminação ou preconceito, que produz muita desigualdade no Brasil.”

“Bandeira de luta prioritária é garantir a participação do negro na sociedade brasileira.”

“A mudança da consciência demanda um período mais longo de tempo. O Brasil ainda tem pouco tempo de redemocratização e nesse curto período a questão do racismo, da discriminação e do preconceito, além da participação do negro na sociedade, não obtiveram destaque, apesar dos avanços. A dificuldade do debate da implantação da políticas de cotas nas universidades e nos concursos públicos – inclusive em Resende -  é um exemplo.  O que vai fazer a sociedade avançar é a inserção do negro nessa sociedade de classes, em funções de poder, advogados, médicos, professores. Aí a sociedade será obrigada a enfrentar o racismo de frente e vai ter que se resolver. Espero estar vivo para ver isso acontecer. “

“O espaço para negros na mídia é resultado de uma pressão de mercado, já que os negros estão alcançando um nível de padrão de consumo e isso interessa aos capitalistas que querem obter lucro. Mas também há o movimento negro, desde Abdias do Nascimento com o teatro experimental do negro. Também conseguimos formar grandes artistas nas escolas de formação. A ampliação das vagas nas universidades com o Prouni e a política de cotas rompeu uma das barreiras que era a qualificação. O desafio é inserir esses jovens no mercado. Várias iniciativas do movimento negro estão abrindo essas portas e nós vamos continuar ocupando mais e mais.” 

“Sérgio Camargo na Fundação Palmares é uma página que deve ser virada. Lamentável, ele expressa o que é o governo para o qual trabalha. Vai para o lixo da história. “

“Eleições gerais, como a de 2022, mobilizam a sociedade e a comunidade negra. A questão racial sempre aparece de forma enviesada, num segundo plano. Mas para a comunidade negra cada eleição se torna mais importante para a tomada de consciência. As ações do STF e do TSE para fortalecer as candidaturas negras, assim como as cotas, vão produzir resultados positivos. O movimento negro está se preparando para lançar candidaturas fortes em diversos estados. Esperamos aumentar a nossa representação principalmente no Senado, na Câmara e nas assembleias estaduais. 

“Por fim, o 20 de novembro é data de celebração, apesar da pandemia impedir nossas festas, encontros, comermos juntos nossas feijoadas. Mas estamos unidos na luta, na fé e certos de que a vitória vai chegar com o fim do racismo, da discriminação e do preconceito contra a população negra. Viva Zumbi, viva o 20 de novembro, viva o povo negro! “ 


Fotos: Alvaro Britto e arquivo pessoal dos entrevistados

Fontes: coalizaonegrapordireitos.org.br; fase.org.br; oxfam.org.b; ceert.org.br


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