Volta Redonda, a maior cidade da região, não tem representação feminina
Por Harrison Nebot*
As mulheres têm percorrido longos caminhos de debates e reivindicações para conseguirem alcançar mais espaço na sociedade, e principalmente nas esferas de poder, de onde saem decisões de políticas públicas que possibilitam a sociedade passar por transformações estruturais. A representatividade feminina nos parlamentos municipais do sul do estado do Rio de Janeiro reflete a falta de paridade de gênero na representação política brasileira, do qual fazem parte os municípios de Angra dos Reis, Barra Mansa, Barra do Piraí, Itatiaia, Paraty, Pinheiral, Piraí, Porto Real, Quatis, Resende, Rio Claro, Rio das Flores, Valença, Três Rios e Volta Redonda.
Das 15 cidades pesquisadas, nenhuma casa legislativa possui mais de 30% do gênero feminino. Angra dos Reis lidera o ranking com quatro vereadoras, representando 29% do total de 14 assentos. Gabi Greg (PP), Jane Veiga (MDB), Luciana Valverde (MDB) e Titi Brasil (MDB) formam o time de mulheres angrenses no poder. Na avaliação dos números, das 21 cadeiras com representantes femininas do sul fluminense, 17 estão ocupadas por vereadoras em primeiro mandato, resultando em 81% do total. O que gera um alerta em como manter as mulheres no poder e a realidade da violência política de gênero.
Nas piores colocações da média regional, que não elegeram nenhuma representante: Itatiaia, Piraí, Rio Claro, Rio das Flores e Volta Redonda. A Cidade do Aço, o maior munícipio da região, chama atenção por não ter nenhuma mulher em suas fileiras. Ela conta com 224 mil eleitores, sendo 53,38% de mulheres, além de ter uma grande efervescência cultural, política e econômica.
Algumas características que levariam mais vozes femininas ao legislativo são a grande amplitude de debate através das universidades existentes no município, criação de movimentos sociais. Além disso, partidos que tradicionalmente elegem mulheres, como PT e Psol, poderiam eventualmente dar vitória para a ala feminina para não ficar em uma posição tão desconfortável entre os maiores municípios da região sul.
Partidos refletem política nacional
Apesar de não possuírem mandatos carregados de atuação conservadora, as vereadoras eleitas são, em sua maioria, de partidos que dão sustentação ao presidente Jair Bolsonaro (PL).
O PSL e MDB são os que possuem o maior número de vereadoras, cada um com três parlamentares, já o PP e Republicanos possuem duas. Os partidos DC, PMB, PATRIOTA e PTB possuem apenas uma representante. Esses partidos adentraram a onda conservadora, o que refletiu nas eleições municipais de 2020.
Na esteira de uma oposição com menor representatividade no âmbito nacional, as eleitas para os parlamentos municipais de centro e de centro-esquerda na região tiveram duas vitórias do PT. Já os partidos PSB, PV, Rede e Cidadania conquistaram apenas uma vaga nos municípios da região.
As duas vereadoras que mais são posicionadas ideologicamente com seus partidos e levantam pautas nacionais em seus munícipios nas sessões legislativas são duas professoras, Fernanda Carreiro e Flora, de Barra Mansa e Paraty, respectivamente. Nas redes sociais de ambas é possível perceber a forte atuação legislativa ligada ao Partido dos Trabalhadores e às pautas da esquerda.
Fernanda Carreiro (PT) ressalta a atuação solitária dentro do ambiente tradicionalmente masculino e machista.
- Sou mulher, professora, sindicalista, e por fim, petista. O combo perfeito para que fique isolada dentro da Câmara Municipal que é praticamente toda governista. E apesar de sermos quatro mulheres aqui, o debate sobre a nossa importância e participação fica muito reduzido pois não basta ser mulher para entender a opressão do patriarcado. É preciso compreender e absorver as nuances do machismo para enfrentar o dia a dia da política – disse a vereadora.
A parlamentar quando questionada se há uma união entre as mulheres que exercem mandato na Câmara de Barra Mansa esclarece a dinâmica da cidade.
- A questão da participação e empoderamento da mulher, independente de esquerda e direita, quem transita em um ambiente democrático e zela por ele, sabe que o debate sobre mulheres é salutar para que avancemos mais. É lamentável que não tenhamos uma Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher para proteger e identificar possíveis mudanças no município. Somos uma das maiores cidades da nossa região e precisamos urgentemente pautar debates ligados a diversos temas como mulheres, LGBTQIA+, negritude e distribuição de renda – afirmou Fernanda.
Jovem surpreendeu com grande votação em Três Rios
A jornalista e empreendedora Bia Bogossian, alcançou votação expressiva na cidade de Três Rios, foi a segunda vereadora mais votada no placar geral e a primeira entre as mulheres. O mandato da jovem vereadora tem bandeiras progressistas como pautas LGBTQIA+ e defesa das mulheres.
Bogossian tem o maior número de seguidores nas redes socias entre todas as parlamentares do sul do estado, são mais de 10 mil apenas no Instagram. A jovem é ligada ao Movimento Acredito e ao Renova Brasil, os mesmos aos quais pertence a deputada paulista Tábata Amaral. O destaque também vai para os famosos que seguem a vereadora líder em votação, Rene Silva (a Voz das Comunidades) e a atriz Maria Ribeiro.
A vereadora reflete, em entrevista, o sucesso nas urnas, redes sociais e propostas para Três Rios.
Você é a vereadora mais jovem do Sul Fluminense, 23 anos, e dentro desse universo político o que te motivou a entrar para a disputa eleitoral?
O que me motivou foi uma grande questão que é pensar que as políticas públicas são a maior ferramenta de transformação na vida das pessoas. O que eu sempre comparo é dizer que nós, como indivíduos, podemos ir na rua, pegar e ajudar uma pessoa que é um morador de rua, por exemplo, nós como indivíduos. E aí a gente ajuda a transformar a vida daquela pessoa. Só que via políticas públicas a gente pode transformar a vida de muitas pessoas, pode ter uma política pública que tire todos os moradores da rua, né? E faça com que eles tenham dignidade e etc. Então, peguei um exemplo assim pra explicar que a minha maior motivação vem disso.
A sua votação foi expressiva, qual ingrediente desse sucesso nas urnas?
O ingrediente é um mix de muito propósito e muita estratégia. Então, não adianta propósito sem estratégia, não adianta estratégia se não tiver um grande propósito, as pessoas sacam isso. Se você tem um grande propósito, mas não tem uma campanha muito bem planejada esse teu propósito não vai ficar claro para as pessoas e não vai tocar o coração delas. E se você tem muita estratégia, muito dinheiro e diversos mecanismos eleitorais, mas você não tem um propósito verdadeiro, as pessoas percebem isso também e não vão te eleger. A gente tinha uma equipe de voluntários jovens que ajudaram muito, pensando junto em cada ação pra atingir cada público nosso. E aí a gente canalizava em comunicação, marketing e todo o plano de mandato, todo o projeto de política que eu tenho pra Três Rios.
Como vereadora em exercício de mandato você tem o maior número de seguidores nas redes sociais das 21 mulheres que ocupam cadeiras legislativas do Sul Fluminense. A sua campanha e seu mandato tem atenção especial nas redes sociais?
Sim, tem uma grande importância a rede social no meu mandato. Isso é inclusive uma questão muito complexa pra eu lidar como pessoa, porque as coisas se misturaram muito, minhas redes sociais deixaram de ser pessoais e passaram a ser uma ferramenta de trabalho. Mas eu também gosto de postar sobre minha vida pessoal e as vezes as pessoas não sabem lidar. Esperam que o político seja um robô que só vai postar as coisas boas e bonitinhas. E nem tudo vai agradar a todos, porém eu gosto de ser bem verdadeira. Eu uso muito o meu alcance nas redes e é muito bom porque eu consigo me comunicar sobre os assuntos relevantes para a cidade, como votações da legislação orçamentária. Eu vejo que a população de Três Rios está participando de momentos importantes para o município. E democratizar a informação é importante. Por outro lado, a internet dá palco para discursos de ódio e muita negatividade. Preciso ter inteligência emocional para lidar com tudo isso, porém é uma ferramenta muito importante pro meu mandato.
Em algum momento da sua atuação no parlamento de Três Rios você já percebeu alguma atitude machista que te impedisse ou tentasse restringir suas ações dentro da casa legislativa?
Sim, com certeza. Eu acho que o parlamento reflete a nossa sociedade que é machista, né? O patriarcado e todo o nosso histórico de sociedade e a política é um desses locais em que o machismo ainda é muito exacerbado. Já ouvi de um vereador, por exemplo, durante a sessão insinuando que eu deveria tirar meu casaco, em uma atitude claramente de cunho sexual e machista. O tipo de brincadeira que não se faz em um ambiente de trabalho mas, eu acho que com a educação e aos poucos explicando pra esses caras o quanto isso é ultrapassado podemos evoluir. Essa suposta brincadeira não é mais aceita na minha geração, e que estamos tratando de um tema sério e não é legal esse tipo de insinuação. Tenho sido resiliente e paciente para atualizar os homens sobre essa nova realidade. E já tentaram sim evitar a minha ida para a mesa de diretora, inclusive os homens foram ao banheiro masculino para tentar derrubar a minha vitória.
Apesar de Três Rios ser uma cidade pequena, você tem um apelo grande nas redes sociais, pretende alçar voos mais altos, como uma candidatura a deputada estadual ou federal?
Sim, tenho muita vontade de seguir uma carreira política. Então tenho sim pretensões de outras candidaturas e alçar voos mais altos, como você disse. Há possibilidade de ser por agora mas, ainda estou analisando questões pra ver se faz sentido que seja em breve ou mais pra frente.
Violência de gênero na política
O termo violência de gênero na política foi recentemente empregado para denunciar abusos contra mulheres que atuam na política e tem gerado grande debate na sociedade e até mesmo na Justiça Eleitoral. Os desacatos cometidos por homens para tirar a legitimidade de mulheres que se propõe ingressar na vida pública são diversos, e por consequência, acarretam na não permanência quando elas conseguem alcançar o poder. A violência muitas vezes começa antes mesmo da consagração nas urnas e o enfrentamento se inicia nas pré-candidaturas e campanhas eleitorais.
O que dá ressonância à região Sul Fluminense visto que há um número de 81% de vereadoras em primeiro mandato. Viabilizar a permanência das mulheres no poder e investir em mecanismos com esse objetivo é um dever cívico para ter a participação justa da representatividade feminina.
Em 2019, o Tribunal Superior Eleitoral lançou a campanha “Participa Mulher” com a finalidade de concentrar e divulgar dados sobre a participação feminina nas eleições e números sobre as eleitas para diversas esferas do poder.
Relembrando alguns casos que marcaram o país quando o termo “violência política de gênero” ainda não era instituído, temos como exemplo a utilização de adesivos em carros com a imagem depreciativa da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2015 quando os preços dos combustíveis aumentaram. Em 2020 foi a grotesca imagem, registrada ao vivo pela TV ALESP, do assédio sofrido pela então deputada estadual Isa Penna (Psol-SP). O deputado Fernando Cury (Cidadania) apalpou os seios da parlamentar e a envolveu em um abraço sem seu consentimento. O deputado ficou afastado – voltou ao mandato em outubro passado – do cargo por 180 dias, em decisão unânime da Assembleia Legislativa de São Paulo. Também o Ministério Público – SP denunciou o político pelo crime de importunação sexual no mesmo processo movido pela deputada Isa Penna (Psol). A justiça acatou recentemente a denúncia, tornando o deputado réu.
* Estudante de Jornalismo
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